terça-feira, 24 de maio de 2016

Família é um lugar estranhamente grande

para a família que me viu nascer, para as famílias que me fazem crescer


Família é coisa complicada. Uns dizem que a escolhemos quando somos seres idealizados, outros que não a escolhemos, que simplesmente nascemos nela fruto (supõe-se) do amor de duas pessoas.
Se como numa tela juntarmos mais tinta a estas duas hipóteses, quero dizer um contexto, a definição de família torna-se ainda mais complexa.
Os que já se passearam comigo  sabem (ou um dia hão-de descobrir) que gosto de espreitar por portas e janelas entreabertas e imaginar as vidas que dão vida àquele lugar. É uma curiosidade como outra qualquer que mais não serve do que para distrair a mente em passos errantes.

Desde que estou em Dakar a curiosidade para entrar nas casas foi crescendo, desde o tempo em que procurava a minha própria casa. Queria perceber como se movimenta uma família entre saias, véus, pés descalços, esteiras, água, incenso, thieboun-dieun.




Um dia, de surpresa, o convite chegou para ir a Kebemer e participar num encontro de família. Entre a curiosidade e o não saber como seria lá fui eu com a família que me convidou.




Kebemer fica a quase 145 km de Dakar. A viagem de carro foi revelando um outro Senegal entre uma e outra paragem por questões mecânicas: os baobab, as construções, as mesquitas, as palmeiras, o alcatrão, a areia, os cavalos e a família de caprinos, os mercados e o colorido dos panos.




Chegámos, percorremos o bairro e passámos o portão. Beijos, abraços, boas-vindas numa mistura de francês e wolof.



 

Os pés descalços e o descanso na sala enquanto a barriga se enche de thiakry.




Os registos fotográficos, as curiosidades de ambas as partes, a partilha de histórias.
A família que aumenta com os que vão chegando para o almoço.





Fruta em cima da cama onde se partilham histórias de mulheres, risos, muitos risos na descoberta do bin-bin e do levantar do véu da arte de sedução no Senegal.

Uma reunião em família onde tudo se discute, o chá e a partilha de mais histórias ao cair da noite, junto à fogueira do jantar: frango, com batata frita, alface e pão que percorre as mãos.




 







 



Mas antes que o jantar ficasse pronto e a noite mais escura foi tempo da cerimónia. A necessidade, a gratidão  e os sorrisos pelo vestir tradicional.
O sentir-me outra dentro de mim mesma, das roupas que me vestiam. De uma cultura por fora e outra por dentro.

De regresso a casa o pensamento encheu-se de questões interiores, daquelas que nos vestem e nos despem e nos embalam até adormecermos.